Com sua fragrância Bossa, lançada no Brasil no Natal de 2020 e na França em março de 2021, a Granado desejava celebrar seus 150 anos de existência com um perfume tão marcante quanto o Carioca, lançado em 2015 como símbolo do processo de reconstrução da marca a partir de seu berço histórico no centro do Rio de Janeiro.

Tropical, mas sem estereótipos

"Enquanto a fragrância Carioca remetia ao Jardim Botânico e aos bairros do interior da Cidade Maravilhosa, o perfume Bossa cenariza um passeio pelas praias de Ipanema e de Copacabana", explica Cécile Zarokian, que idealizou a fragrância.

Floral e solar, o Bossa quer distância das notas pesadas muitas vezes associadas às praias tropicais. As notas de topo, intensas – limão, mandarina e petitgrain –, contrabalançam as notas de corpo, mais florais e doces (jasmim-manga, almíscar). "Tudo o que eu não queria era criar um sucedâneo de notas pesadas de monoi e coco. Meu medo era cair no estereótipo da francesinha que acaba de descobrir o Brasil", ressalta Cécile Zarokian. Para captar o odor da cidade, ela percorreu o bairro da Urca, aos pés do Pão de Açúcar, onde o cheiro do oceano vem transportado por uma brisa suave e fresca. Criado em plena pandemia de covid-19, o Bossa tem uma personalidade bem-humorada e positiva, criando um ambiente propício ao prazer que reflete a lendária alegria de viver do carioca.

"O projeto ganhou forma em muito pouco tempo. Já na primeira reunião com a equipe da Granado, saí com um briefing bem completo. A marca apreciou a originalidade de minha criação, considerada ao mesmo tempo inovadora para o mercado brasileiro e capaz de seduzir um público amplo", relata Cécile Zarokian.

O perfume Bossa, a exemplo do Carioca, seu antecessor, precisava responder a uma equação complexa: representar o Rio, ou seja, ser um presente perfeito para os turistas em visita ao Brasil, mas sem cair na caricatura, a fim de conquistar também os consumidores brasileiros que criaram laços afetivos com essa marca tradicional.

Numa conversa com Alessandra Tucci, fundadora da Paralela Escola Olfativa, parceira da Cinquième Sens no Brasil, Sissi Freeman, diretora de Marketing da Granado, confidenciou ter selecionado Cécile Zarokian pela importância que a marca confere à inovação. "Convidamos Cécile para esse projeto junto com outros perfumistas que trabalham para diversas casas de fragrâncias. Ela acertou na primeira tentativa, traduzindo perfeitamente a ideia que tínhamos do que viria a ser o Bossa: um perfume com a leveza do mar e do Rio de Janeiro. Há muito tempo desejávamos ter em nossa coleção uma nota de coco bem elaborada".

Perfumes de alta qualidade

"Há vários anos, a Granado deu início a um amplo trabalho de resgate de suas raízes, mas também de aprimoramento da qualidade, com a determinação de criar perfumes bem brasileiros que agradem ao público internacional", explica Cécile Zarokian.

A empresa brasileira – com o apoio do Grupo Puig, que em 2016 adquiriu participação na Granado e é proprietária também da marca Phebo, símbolo da arte da perfumaria no país – utiliza o processo de maceração, técnica muito usada na fabricação tradicional de perfumes na França, mas pouco praticada no Brasil. Para atender às crescentes exigências dos consumidores locais, a empresa deu atenção especial ao frasco, à tampa e à caixa. A ilustração do estojo do Bossa, muito pouco retocada pelos grafistas da Granado, foi diretamente extraída dos arquivos da marca.

Motivos não faltam para que a história de amor entre o Brasil e os perfumes fique ainda mais forte. O país é o segundo maior mercado mundial em termos de volume, posição que ele disputa com os Estados Unidos, e o terceiro ou quarto em termos de valor, dependendo da flutuação do câmbio. Embora a questão econômica tenha um peso considerável no que compram ou deixam de comprar, os brasileiros conhecem muito bem os perfumes internacionais, atualmente à venda em todas as principais cidades do país.

Até os perfumes de nicho começam a ganhar popularidade. Ainda que muitos produtos das marcas internacionais desse segmento sejam inacessíveis para a grande maioria dos consumidores, os fabricantes locais têm apresentado suas próprias interpretações do conceito de nicho, a exemplo do Grupo Boticário, que em abril criou a O.U.I., linha de alta perfumaria idealizada na França e produzida no Brasil.

Os investimentos em qualidade por parte das marcas brasileiras começam a render frutos: em 2020, em plena pandemia de covid, as vendas de perfumes no país registraram um aumento de 8,4%, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC). "Os brasileiros estão se surpreendendo cada vez mais com a oferta das marcas nacionais de perfumes. Além de apresentarem produtos com alto nível de qualidade, nos últimos anos as marcas têm feito investimentos significativos em inovação", informa João Carlos Basilio, presidente da ABIHPEC.

Com o Bossa, a Granado se tornou a primeira grande marca brasileira a trabalhar com uma perfumista francesa independente. Mas a fragrância, disponível em vários formatos de produtos (sabonete, gel de banho e vela, entre outros), foi inteiramente produzida no Brasil. "Para fabricar o perfume, contei com meu parceiro local Vollmens que, em plena crise sanitária, conseguiu trazer para o Brasil as matérias-primas que não estavam disponíveis no país, como limão da Argentina, mandarina da Itália e algumas moléculas sintéticas específicas que eu desejava utilizar", conta Cécile Zarokian.

Embora o lançamento na França – que deveria contar com o apoio de uma pop-up store na Galeries Lafayette da avenida Champs-Élysées – tenha sido perturbado em razão do terceiro período de isolamento, que impôs o fechamento de lojas físicas entre 3 de abril e 3 de maio de 2021, as vendas do Bossa parecem atualmente ter alcançado o nível esperado pela marca. Em todo caso, para a especialista em perfumaria, estratégia e inovação Alessandra Tucci, fundadora da empresa Paralela Escola Olfativa, sediada em São Paulo, o Bossa é "o perfume floral solar que faltava no mercado brasileiro".