Após uma sucessão de resultados aquém do esperado – o lucro do último ano ficou em praticamente metade do que havia sido registrado no exercício anterior –, a marca enfrentou (como todo o setor, aliás) a queda da demanda na China no ano passado e a desaceleração do consumo nos Estados Unidos e na Europa. Porém, a Burberry vem também amargando o fracasso de seus esforços para conquistar um posicionamento ainda mais alto no segmento de luxo.

A marca, responsável pela criação do lendário trench-coat imortalizado por Audrey Hepburn e Humphrey Bogart, não conseguiu evitar o maremoto que abalou seus títulos na Bolsa de Valores: os investidores perderam a confiança e a queda foi vertiginosa. Em um ano, a empresa viu o valor de suas ações no mercado britânico despencar 70%.

Depois de fazer parte, durante 15 anos, da lista de empresas do FTSE 100, principal índice do mercado financeiro de Londres, a Burberry está prestes a dar marcha a ré, passando a integrar o FTSE 250, índice menos prestigioso.

Esse rebaixamento entrará em vigor "na segunda-feira 23 de setembro, a partir da abertura do mercado", anunciou o London Stock Exchange Group (LSEG) em um comunicado divulgado na última quarta.

Erros estratégicos

O FTSE 100, carro-chefe da Bolsa de Londres, reúne as empresas cujas ações registram os valores mais altos do mercado. Regularmente atualizada, a lista está sempre ganhando ou perdendo empresas, em função dos altos e baixos da cotação das ações.

A Burberry não é a única empresa do segmento de luxo a passar por dificuldades: o consumo encolheu em todo o setor, especialmente em um de seus principais mercados, a China, puxando para baixo o lucro de grandes nomes da indústria, como LVMH e Kering, matriz da Gucci.

Além disso, "criar produtos Burberry de altíssimo luxo e depois oferecê-los a preço de banana para diminuir o estoque encalhado foi uma péssima ideia" da grife britânica, comenta Dan Coatsworth, analista da agência AJ Bell. "É claro que o consumidor fica feliz ao ver produtos caros em promoção, mas os descontos podem prejudicar a imagem das marcas de luxo, que passam a ser vistas como menos atraentes".

Em julho, depois de pouco mais de dois anos atuando para a marca, o britânico Jonathan Akeroyd deixou o cargo de diretor-geral, uma demissão "com efeito imediato", segundo a Burberry, que lamentava um "desempenho decepcionante". O britânico foi substituído logo em seguida por um americano, Joshua Schulman, que no passado dirigiu as marcas Michael Kors e Coach, além de ter trabalhado para a Yves Saint-Laurent e a Gucci.

Marca ainda atraente

Para a nova diretoria, "o caminho à frente não parece ser mais fácil", observa Susannah Streeter, analista da Hargreaves Lansdown, ressaltando que a distribuição de dividendos foi suspensa.

Em meados de julho, o anúncio sobre a suspensão dos dividendos, somado à retração de 22% no faturamento do trimestre e à demissão de Jonathan Akeroyd, provocou uma queda no título da Burberry, que despencou mais de 16% em um único dia.

A Burberry espera que novas medidas, em particular uma série de "reduções de custos", comecem "a produzir melhores resultados no segundo semestre". Nesse meio tempo, o baixo valor da empresa no mercado coloca-a numa posição de alvo ideal para uma eventual aquisição de controle, alerta Dan Coatsworth, da AJ Bell.

Isso porque a empresa, fundada em 1856 em Basingstoke (sul da Inglaterra) por um aprendiz da indústria têxtil, mantém, segundo ele, "uma oferta de produtos sempre atraente" e destaca-se como "uma marca consagrada, capaz de sobreviver ao tempo".

A bem-sucedida volta da Burberry ao setor de perfumes, com o lançamento da fragrância Burberry Goddess pela Coty, parece confirmar a visão do analista.

No segmento de cosméticos, também foram muitas as reviravoltas estratégicas da marca. Em 2012, a Burberry decidiu retomar as rédeas da licença de seus produtos de beleza, na época nas mãos da Interparfums, a fim de administrar o segmento diretamente. Em seguida, a Burberry mudou de ideia e confiou à Coty o desenvolvimento de seus perfumes e cosméticos. Depois do sucesso registrado com a volta à categoria de perfumes, o gigante do setor de beleza se prepara atualmente para relançar a marca no segmento de maquiagem.