Vivemos um momento de quebra de estereótipos. As mulheres conquistam novos espaços no mercado de trabalho e maior poder aquisitivo, passando a consumir artigos até então mais voltados ao universo masculino, que vão de cerveja a automóveis. Os homens, por sua vez, se aventuram em territórios tradicionalmente femininos: eles passaram a cuidar não apenas da própria aparência, mas também da casa e dos filhos.

Campanha 'Find Your Magic', da Axe

Campanha ’Find Your Magic’, da Axe

Se o mundo muda, a indústria muda também. A moda unissex voltou aos holofotes recentemente e o setor de cosméticos replicou a quebra de barreiras de gênero com novos lançamentos. Em 2015, a campanha do Boticário para o Dia dos Namorados apresentou a linha Egeo 7 Tentações, uma edição limitada com sete fragrâncias multigênero. A propaganda, que trazia casais heterossexuais e homossexuais trocando presentes, gerou polêmica entre os conservadores e reiterou o posicionamento da marca em prol da tolerância e da diversidade.

Em junho deste ano, a Avon reproduziu o conceito dos cosméticos sem gênero para as maquiagens e lançou no Brasil o BB Cream Matte Color Trend com a campanha “Para TodES” – eliminando a letra “a” ou “o” determinante do gênero. Lançada no Dia Internacional do Orgulho LGBT, ela foi estrelada por jovens representantes da diversidade sexual, como o cantor Liniker e a ativista Jéssica Tauane.

Até a Unilever, que por muito tempo promoveu o desodorante Axe como um artifício para que o homem conquistasse o maior número de mulheres possível, mudou de estratégia. A campanha “Find Your Magic” (em português, “Encontre Sua Magia”) estreou o novo conceito da marca, que foge da imagem do homem másculo e viril e aborda a diversidade masculina com irreverência.

Esta nova maneira de enxergar os gêneros trouxe os cosméticos e perfumes unissex de volta à tona. Mas será que o movimento indica uma nova tendência para os produtos ou é apenas uma tática do mercado para aumentar as vendas? O especialista em perfumes e fundador do 1 Nariz, Dênis Pagani, acredita que trata-se de uma estratégia de marketing. “Essa ideia do genderless me parece uma bolha, um momento. Imagino que daqui a alguns anos, ela será registrada como um pico em um gráfico e não uma mudança de paradigma”.

Para Juliana Martins, analista de beleza e cuidados pessoais da Mintel, o movimento também está atrelado a um fim comercial. “As empresas continuarão a desenvolver produtos para gêneros distintos, mas artigos que podem ser consumidos por homens e mulheres ajudam a atrair mais consumidores”, afirma. De acordo com ela, a crise econômica brasileira pode ter influência nessa tendência, já que os produtos de gênero neutro podem ser compartilhados pelo casal e outros membros da família.

Essa mudança de comportamento está intimamente ligada aos millenials, uma geração que não se rege por rótulos simples. “Talvez seja o surgimento de um novo perfil de consumidor, que passa a ignorar a distinção de gênero na hora de fazer compras”, afirma Pagani. Esta orientação também deve refletir no varejo. "Acho que é hora de se repensar a configuração das lojas e aplicar uma comunicação menos dirigida para arquétipos masculinos e femininos", ele pondera.

Mas segundo Pagani, ainda estamos falando de uma parcela bastante pequena do mercado. “A perfumaria de massa mantém a tradição de rotular suas fragrâncias como perfume masculino ou feminino. Se essa tendência multigênero realmente ganhar força, ainda levará um tempo para que outras marcas mudem sua forma de se comunicar com o público”.